3.1.08

13. Garrincha (4º lugar)

Em 1999, fiz miniperfis de 21 jogadores publicados na revista Placar, para uma edição sobre os 100 maiores craques do século 20. Reproduzo aqui os meus 21 textos... Nada melhor que começar por Garrincha. Daqui a 17 dias, fará 25 anos de sua morte. Vamos ver quem vai lembrar.
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Garrincha, 4º colocado (em 1º ficou Pelé, em 2º foi eleito Maradona e em 3º esteve Cruyff) *vídeo* (28.10.1933/20.1.1983)
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"Menino de Asas"
Dizer o que de quem fez a torcida gritar pela primeira vez olé dentro de um estádio de futebol? E nem era a torcida do time dele, o Botafogo, mas sim mexicanos que assistiam a uma de suas exibições pelo mundo. O jogo valia por um desses torneios caça-níqueis aos quais o time carioca era convidado. O adversário do Botafogo era o River Plate, da Argentina — o jogo terminou empatado por 1 x 1. O adversário de Garrincha era apenas o lateral Vairo, que, de tão humilhado em campo, acabou substituído. Num dos dribles, o ponta parou, encarou o inimigo e partiu para o cruzamento, como se não houvesse ninguém por ali. Os torcedores soltaram o primeiro "olé", expressão até então típica de touradas. “Não há nada o que fazer, é impossível”, sentenciou Vairo ao sair do gramado. João Saldanha, técnico do Botafogo na época, notou que o argentino estava feliz.
Não havia mesmo nada a fazer diante de Garrincha. Assim como não há como defini-lo senão dizendo que Mané arrebentava. Era imprevisível e dono de um futebol que jamais se enquadrou a esquemas táticos, características que lhe renderam uma das mais incorretas famas dentro do futebol nacional, a de que preferia o drible ao gol, a inconseqüência à vitória. Seu amor pelo espetáculo não significou, em momento algum, que Mané não fosse um atleta obcecado pela vitória. Era, sim. Em quase 13 anos no Botafogo, conquistou os títulos cariocas de 1957, 1961 e 1962 e fez 579 jogos (249 gols). Pela Seleção Brasileira, jogou 50 vezes (13 gols) e perdeu apenas uma — a última, na Copa de 1966, nos 3 x 1 para a Hungria. E quando jogou ao lado de Pelé, o Brasil nunca foi derrotado. É isso mesmo: com Pelé e Garrincha de camisa amarela, ou dava empate ou dava Brasil.
Uma das pessoas que melhor entenderam Mané foi outro botafoguense histórico, o dublê de cronista, jornalista e treinador João Saldanha. “Daqui a 400 anos, toda vez que falarem de futebol, terão de falar de Mané Garrincha”, resumiu Saldanha. Nada mais justo para o ponta que ganhou lugar no time principal do Botafogo por humilhar o lateral de Seleção Brasileira Nilton Santos num treino. “Se Mané não estivesse no mesmo time que eu, dificilmente eu jogaria até os 38 anos e teria sido titular numa Copa do Mundo aos 37”, admitia Nilton Santos, certo de que todos os laterais-esquerdos do país caíam no ostracismo ao enfrentar Garrincha.
Os estragos que fazia com a camisa botafoguense ele repetia com a da Seleção Brasileira. Mané foi bicampeão mundial e, para muitos, não fosse ele o Brasil teria saído da Copa do Chile, em 1962, muito mais cedo. Naquele mundial, Pelé machucou-se no segundo jogo e não voltaria mais ao time. Pois Garrincha assumiu o comando da Seleção, fez quatro gols – tornando-se um dos artilheiros do torneio – e voltou de Santiago com a taça na bagagem. O jornal chileno “El Mercurio” resumiu o que foi a participação dele na Copa com a manchete “De que planeta vem Garrincha?”.
Em 1965, os problemas crônicos com os joelhos já o impediam de jogar e Garrincha praticamente se despediu do Botafogo. No ano seguinte, foi para o Corinthians e depois para o Flamengo. Não tinha mais, no entanto, a mesma ginga, o mesmo arranque. Dispensado, passou a rodar atrás de clubes menores. Vestiu a camisa do Milionários, do Olaria e fez vários jogos na várzea – nos quais ganhava algum dinheiro por partida. Sua última apresentação com uma camisa 7 nas costas aconteceu de forma melancólica, no Natal de 1982. Mané estava com 49 anos e jogou 20 minutos pelo Planaltina, do Distrito Federal, contra um time sindical. Menos de um mês depois, dia 20 de janeiro de 1983, morreu de crise depressiva e em função do porre que havia tomado no Natal.
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Pane nos soviéticos. Maior potência espacial do fim dos anos 50, a União Soviética levava tão a sério a tecnologia que tinha conseguido alguns filmes de jogos do Botafogo, além da ficha completa de Garrincha para brecar o atacante do Brasil na Copa de 1958. Deu dó. Na primeira bola, Mané cortou o zagueiro e mandou a paulada na trave. Era a estréia dele numa Copa e, com míseros 60 segundos, começava a entrar em pane o arsenal tecnológico soviético, capaz de pôr o primeiro homem no espaço, mas insuficiente para brecar Manoel Francisco dos Santos.

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